terça-feira, 27 de outubro de 2009

21/10 - “Oração não é outra coisa senão tratar de amizade estando muitas vezes tratando a sós com quem sabemos que nos ama.” Palestrante: Fr. Leandro

A oração, encontro de amigos

Tanto na formulação teresiana como na sanjuanista, a oração aparece claramente desde o princípio como a experiência e o sinal de encontro interpessoal, relação entre pessoas, Deus e o crente. É, portanto relação entranhada que Deus abre como graça a suas criaturas racionais.

No magistério de João da Cruz aparece com clareza a união entre oração e a virtudes teologias. Ensinado sobre o recolhimento, diz: “não levando a alma a outro sustento a oração senão a fé, a esperança e o amor” (dito 123). Recolhimento não é outra coisa senão “por toda a alma só no bem incompreensível e separá-la de todas as coisas compreensíveis” (3S 4,2), é deixar tudo quanto não é Ele. É portanto um relacionamento de PESSOA A PESSOA, UM TU A TU.

Este encontro interpessoal que é a oração, Teresa o viveu e o expressou em uma palavra intrinsecamente humana: a amizade: “que não é outra coisa a oração mental senão tratar de amizade, estando muitas vezes a sós com quem sabemos que nos ama” (V 8,5).

Quando a Santa Madre cunhou essa definição, tinha como pano de fundo sua larga e qualificada história de amizade humana e divina. História de amizade qualificada com esses dois adjetivos em atenção a nossa fragilidade intelectual e a nossa tendência em romper a harmonia e integração do divino e humano, da relação com Deus e com o próximo, o amor e o serviço vividos no silêncio da oração e no empenho pela causa do Reino, também no trabalho de cada dia. No caminho da oração essa dicotomia não pode haver. Pois uma vida de oração autêntica não se distancia da realidade.

Deus nos chamou a sua amizade, a compartilhar sua vida, oferecendo-nos seu Filho, amigo verdadeiro, proximidade entranhada em sua humanidade que é a nossa, homem de fraqueza e trabalhos. Deus nos acompanha no caminho da vida. Deus, amigo, nos amou primeiro,nos elegeu, abrindo-nos as portas de sua amizade.

A oração - amizade se situa no centro da vida, não às margens, na periferia, ou naquilo que sai do ordinário da vida. É valor da vida em todas as suas dimensões. Somos o que é nossa relação com Deus e os irmãos.

A oração- amizade é vida e exercício de gratuidade, não entra no mercado do útil ou do necessário. Tem em si mesma sua justificação, seu valor, ou seja, realizar a vocação de ser – em relação, ser e viver-com, em comunhão de horizontes e de caminhos. Teresa nos convida a sermos pessoas orantes, mas também insiste no ato concreto da oração, só para servir a Cristo Crucificado. (4M 2,10)

Na oração-amizade o amor é a substância. Entre os amigos circula o amor, a acolhida e a doação mútua. Isto expressa claramente Teresa: “a substância da perfeita oração não está em pensar muito, mas em muito amar”. Nem todos têm a habilidade natural para meditar, mas todas as almas têm a capacidade de amar (F 5,2). Assim todas as pessoas têm a capacidade de rezar; a oração está aberta a todos, seja qual for sua psicologia, sua formação, o tempo disponível, a situação concreta pela qual passem.

A pessoa, por natureza e graça, é capaz de ter esta relação pessoal com Deus. Sendo amizade, a oração abarca toda a existência da pessoa, e não pode estar reduzida aquilo que comumente chamamos de oração silenciosa ou litúrgica, pessoal ou comunitária: Assim expressa Teresa: “o verdadeiro amante ama em toda parte e sempre se lembra do amado” (F 5,16). O Senhor, o “verdadeiro amante” tem abertos todos os caminhos para nos comunicar a abundância do seu amor seu amor.

“A oração-amizade exige e relativiza ao mesmo tempo os momentos de oração. Exige-os, porque a amizade é força de presença totalitária, procura do trato a sós com Deus a amizade experimenta-se como necessidade imperiosa de encontro a sós com Aquele de quem nos sabemos amados. Mas relativiza esses tempos de oração porque a oração-amizade abre-se à vida. Esta se apresenta como o grande espaço para a vivência da amizade. Basta assegurar a presença do Amigo, ou se quisermos, viver a vida em fidelidade à amizade. Por que? Porque ligar oração-amizade significa, realmente fazê-la consistir na relação que se estabelece entre duas pessoas, significa carregar o acento sobre aqueles que são protagonistas dessa história a que chamamos oração-amizade”. (Maximiliano Herraiz Garcia)

Outro elemento da oração-amizade é, antes de tudo, uma forma de ser. Portanto, a oração define a vida da pessoa. “para os que começam a ser servos do amor que outra coisa não é, senão, determinarmos a seguir pelo caminho da oração ao que tanto nos amou. (V 11,1)

Somente partindo da oração-amizade podemos falar racionalmente de “necessidade” de oração. Necessidade que parte de dentro, ou seja, do chamado de Deus que nos dá capacidade para tratar amigavelmente com Ele. Somos capazes de relação, de “natureza tão rica que podemos conversar não menos que com Deus” (1M 1, 6). Nos é realmente possível ter esse diálogo com Deus porque estamos capacitados para tal. Necessidade que percebe e padece somente quem a procura viver intimamente.

Na medida em que vamos tomando consciência de que somos amados por Deus aumenta essa necessidade sentida pela pessoa de crescer nessa amizade com Deus e com os demais. Saber-se amado é o elemento essencial para o exercício da oração-amizade.

Ninguém se sabe amado por referência de terceiros; mas é preciso o encontro pessoal. A notícia recebida provoca o desejo da constatação por si mesmo. O ato de oração é a consciência explícita da amizade que une Deus e a pessoa.

O protagonista da oração é o próprio Deus que se empenha muito mais do que nós par levar à frente essa história de amizade. Podemos dizer que a oração cristã é mística desde o começo. Deus, porque nos ama mais e melhor do que nós a ele, leva o “peso” da oração-amizade. “o Senhor deseja tanto que o queiramos e procuremos sua companhia que vez ou outra não nos deixa de chamar para que nos aproximemos a Ele” (2M 2).

GARCIA, Maximiliano Herráiz. Un camino de experiencia: 30 días de Ejercicios con santa Teresa de Jesús y san Juan de La Cruz. Ed. Monte Carmelo. p. 46-52. A tradução é nossa e não está presente todo o texto indicado nas páginas.

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